quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Nossa Senhora Aparecida e a Identidade nacional do Brasil

Juliana Beatriz Almeida de Souza

1717. Outubro. Guaratinguetá. Três pescadores – João Alves, Domingos Garcia e Felipe Pedroso – jogavam insistentemente suas redes no rio Paraíba. A época não estava boa para a pesca. Havia horas eles tinham posto suas canoas naquelas águas e, até aquele momento, nenhum resultado. Não podiam, entretanto, desistir.

Tinham sido convocados para que pegassem muitos peixes. O Governador da Capitania de Minas Gerais e São Paulo – Dom Pedro de Almeida Portugal -, em viagem para o interior da Capitania, ia passar por aquela vila. Era preciso bem recebê-lo.

Mais uma vez, João Alves lançou sua rede. Ao puxá-la, no fundo da malha viram um pequeno objeto de cor escura. Identificaram-no como sendo a imagem de Nossa Senhora da Conceição, sem a cabeça. João Alves atirou de novo a rede. Veio, então, a cabeça da imagem. Os três guardaram-na na canoa, voltando-se, em seguida, para a pesca. Suas redes vieram, então, à tona abarrotadas de peixes, enchendo os barcos em pouco tempo.
Caía a noite no Vale.

Essa breve narrativa inicial, com proposital ausência de detalhes, procura mostrar como se deu o encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida. As graduações e matizes que se podem imprimir a esse relato possibilitam conotações antes não imagináveis.

Encontrada em 1717, a imagem de Nossa Senhora teve seu culto oficializado em 1743. Nos primeiros anos a imagem ficou com Felipe Pedroso – um dos três pescadores –, que a conservou em sua casa, onde ela foi venerada pela família e seus vizinhos. Após sua morte, seu filho – Atanásio Pedroso – construiu-lhe um oratório e um altar. E a devoção foi crescendo.

Já na segunda metade do século XVIII, capelas dedicadas a Nossa Senhora Aparecida foram construídas em outros lugares, mesmo fora do Vale do Paraíba, para onde sua “fama” fora levada por tropeiros, mineradores, sertanistas.

O culto à Senhora de Aparecida, então, começou entre os colonos, os moradores de Porto de Itaguaçu, no Vale do Paraíba. Primeiro, as famílias – poucas, ainda – reuniam-se todos os sábados para diante da imagem rezar o terço e cantar em seu louvor. Depois, eram os que passavam pelo caminho e vinham agradecer-lhe ou pedir sua intercessão.

No século XIX, as peregrinações e romarias à capela, registradas pelos viajantes do período – Spix e Von Martius, em 1817 1, por exemplo –, significaram a expansão do culto, que rompeu os limites da Província de São Paulo.

E a capela já recebia visitas “ilustres” àquela época, como a da Princesa Isabel e do Conde D’Eu quando da festa da Imaculada Conceição, em 8 de dezembro de 1868. Consta, inclusive, que na ocasião a princesa doou a Nossa Senhora uma coroa de ouro que é até hoje usada na imagem.

Com o início da República, veio o fim do Padroado, a laicização do Estado e a romanização da Igreja no Brasil. Mas essa expressão da religiosidade popular resistiu e cresceu, parecendo não ter sofrido os cerceamentos que tiveram outras festas populares, como a de Nossa Senhora da Penha ou do Divino, ambas no Rio de Janeiro. O final do século XIX significou para a Igreja o seu desenvolvimento institucional, com o fortalecimento das suas estruturas internas.

Novas dioceses foram criadas, aumentou o controle episcopal sobre o clero, as ordens religiosas cresceram e veio um novo fluxo de clero estrangeiro. Foi nessa época – 1894 – que chegaram ao Brasil os primeiros missionários redentoristas. Vindos da Baviera, eles assumiram, em janeiro de 1895, a direção do Santuário de Aparecida, procurando dar-lhe uma vida religiosa dentro dos moldes tridentinos.

O padre Júlio Brustoloni 2 aponta como primeira das causas para a expansão do culto a ressonância da imagem na vida cotidiana dos fiéis, ou melhor, no sentimento religioso popular. De um “altar de paus” a santuário nacional. De povoado ao redor da capela à cidade. De culto popular ao padroado do País. São mais de dois séculos de história devocional. Uma devoção que se expandiu e ganhou proporções deixando-nos a pergunta: por quê? Em uma religião de tantos santos, em meio a um povo de tantos mártires, por que Nossa Senhora Aparecida foi a escolhida para ser a Padroeira do Brasil?

Um caminho possível para desvendarmos como e por que essa devoção foi tomando tal dimensão, ao longo dos anos, é procurar perceber, nas descrições da “aparição”, que simbolismos e que significados lhe foram atribuídos.

Ao analisarmos os relatos que recontam o encontro da imagem, pelo menos dois traços comuns podem ser notados. O primeiro deles é a ênfase dada à “maternidade” de Maria, ou melhor, à virgem de Aparecida. Ela é mãe do povo brasileiro. Mãe dos pobres, inclusive, ou, talvez, em especial. A metáfora Maria/Mãe está presente tanto na devoção popular quanto na doutrina oficial da Igreja, ainda que em nuances diferentes.

Para a doutrina oficial, Maria é a Mãe carinhosa, mas Cristo, como filho de Deus, está em uma posição superior à sua. Entretanto, dentro da religiosidade popular, Maria, Mãe de uma família de santos e, mais do que isso, do povo, encontra-se em uma posição de destaque. Maria, assim, cumpre, como os santos, papel de protetora.

Dela se esperam “milagres” que, na realidade, correspondem ao restabelecimento da ordem perturbada. Em troca dos pedidos, “promessas”, e a reafirmação da fidelidade eterna.

O segundo traço comum, em geral, nas narrativas da “aparição” é a tentativa de se encontrar na situação colonial o “Brasil” contemporâneo, explicando o passado pelo que será o seu futuro. Os pescadores – homens livres e pobres, mestiços – são uma espécie de “embrião” do ser “brasileiro”.

Não raros nesses relatos são apontados indícios do sentimento de nacionalidade, de brasilidade, mesmo, no esforço de imprimir à devoção um caráter nacional desde o começo.

A história de Nossa Senhora Aparecida é, de fato, muito rica. Em setembro de 1929, logo após o Congresso Mariano, no qual se comemorou o Jubileu de Prata da Coroação da Virgem, o episcopado brasileiro pediu ao Papa que ela fosse oficialmente reconhecida Padroeira do Brasil. A 16 de julho de 1930, Pio XI declarava aceito o pedido.

Os anos 30 para a Igreja, foram anos em que, defendendo a hierarquia e a ordem, ela buscou sua consolidação interna e a reafirmação da sua imagem na sociedade brasileira. Ao mesmo tempo, o Estado procurou instaurar uma “nova ordem” movida pelo trabalho e baseada na conservação da família tradicional, a fim de conseguir o consenso e a conciliação das forças sociais e políticas.

A religião católica podia bem ter sido um dos elos capazes de unir a todos dentro do processo de formação do “homem novo” 3 tão caro à legitimação da ideologia política do Estado.

A escolha de Nossa Senhora Aparecida, talvez, então, faça parte da tentativa de se criar uma identidade nacional que não passava só pela condição de trabalhador mas também pela de ser católico.

A festa de proclamação do Padroado, em 31 de maio de 1931, no Rio de Janeiro, então capital federal é, nesse sentido, emblemática. A imagem deixou seu nicho e fez sua peregrinação de Aparecida à capital. Antes de ser colocada no altar, a virgem foi apresentada ao presidente Getúlio Vargas, que junto com sua família lhe foi prestar homenagem. Dom Leme, que teria sido o principal articulador do movimento que encaminhou o pedido a Roma, deu início ao ato na presença de devotos e representantes das autoridades civis, militares e eclesiásticas.

Nossa Senhora Aparecida parece ter mesmo a favor de si muitos dados para congregar o “Brasil” em torno de sua devoção. Sua imagem falava bem aos mais desfavorecidos e podia ser, então, de todos os brasileiros. Encontrada por pescadores, trabalhadores simples, seu primeiro “templo” foi a casa de uma família.

O local da “aparição” – São Paulo – fica entre o caminho do mar – Rio de Janeiro – e o interior – Minas Gerais. E basta olhá-la para descobrir mais um elemento profundamente significativo: a sua cor negra. Faz-nos pensar porque uma religião “branca” tenha escolhido uma virgem negra 4 para padroeira de um país que se diz branco.
Hoje, ainda se pode questionar quantos conhecem de fato a história da Virgem de Aparecida.

Pode-se mesmo dizer que o povo e o clero nunca rezaram para a mesma imagem 5. Mas não se pode desprezar a importância de se considerar a sua escolha para uma melhor compreensão do período e da sociedade brasileira, marcada pela presença da Igreja Católica desde a sua colonização. Se, como diz Robert Darnton 6, cabe ao historiador investigar como as pessoas “comuns” entendem e pensam o mundo, assim como expressam a realidade em seu comportamento, o entendimento da estrutura das crenças no espaço do cotidiano pode ser relacionado com as conjunturas históricas mais amplas.

A religiosidade torna-se uma estratégia de vida, à medida que faz parte das diretrizes de organização do cotidiano dos populares, na busca de uma identidade própria.

 

NOTAS

1 - Spix & Von Martius. Viagem pelo Brasil (1817), 2ª ed., SP, Melhoramentos, s/d., pp. 129-131.

2 - Brustoloni, J. A Senhora da Conceição Aparecida. 6ª ed., SP, Editora Santuário, 1986.

3 - Gomes, Ângela M. de Castro. A invenção do trabalhismo. SP/RJ, Vértice/IUPERJ, 1988.

4 - A imagem, feita de terracota, deve sua cor, provavelmente, ao fato de ter ficado submersa no lodo das águas do rio Paraíba e ter sido exposta à fumaça das velas quando ainda se encontrava na casa dos pescadores e no oratório do Porto de Itaguaçu. Nas descrições, em geral, faz-se referência à cor da imagem que aparece em oposição às suas outras características. Bom exemplo disso está na Crônica Anual dos Padres Jesuítas de Roma, em 1750, que diz: "A imagem é de cor escura, mas afamada pelos muitos milagres operados".

5 - Fernandes, Rubem César. "Aparecida: nossa rainha, senhora e mãe, sarava!" in: Sachs, V. (org.) Brasil & Estados Unidos: religião e identidade nacional. RJ, Graal, 1988, pp. 85-111.

6 - Darnton, R. O Grande Massacre dos Gatos. RJ, Graal, 1986.

 

Sobre a autora:

Juliana Beatriz Almeida de Souza Recebeu o prêmio do concurso de Iniciação Científica da Universidade Federal Fluminense pela pesquisa sobre a devoção a Nossa Senhora Aparecida.

Publicado no D.O. Leitura – Publicação Cultural da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo – em dezembro de 1993.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Referências: apud, et al., et seq., idem, id., op. cit., passim etc

 

17 de dezembro de 2012

por Luiz Carlos Rodrigues

Para os que já leram algum artigo científico certamente já repararam algumas abreviações, a princípio sem significado, nas notas de rodapé e nas referências bibliográficas. Essas abreviações possuem sim um significado e devem ser utilizadas para esclarecer a nota. O problema é que a maioria (incluindo eu antes dessa pesquisa) não sabe o significado desses termos e, na maioria das vezes, simplesmente pula para a palavra seguinte.

O objetivo deste post é listar esses termos, qual o significado de cada um e principalmente dar exemplos de suas utilizações. Seguem:


apud

- (do latim junto a; em) citado por, conforme, segundo – Indica a fonte de uma citação indireta.

Para referenciar um autor (a cuja obra o pesquisador NÃO teve acesso) que está indicado num livro ao qual o pesquisador TEVE acesso, usa-se apud. Ex.:

(ANDERSON, 1981 apud ARÉVALO, 1997, p. 73)

Estudos de Zapeda (apud MELO, 1995, p. 5) mostram [...]

BUTERA apud MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, v. 6, p. 80.
OBS: A expressão apud é a única que pode ser usada em notas e no texto. As demais, somente em notas.


Cf.

– confira, confronte, compare

Cf. GOMES, 2001


et al. – et alii (masculino),  ou et aliae (feminino), et alia (neutro)

e outros. É comumente usado quando você não quer nomear todas as pessoas ou coisas numa lista. Ex.:

Eichelberger JP, Schwar KQ Black ER, et al. Predictive value of dobutamine echocardiography just before noncardiac vascular surgery. Am J Cardiol 1993;73:602-7.

William MJ, Odabashian J, Lauer MS, et al. Prognostic value of dobutamine echocrdiography in patients with left ventricular dysfunction. J Am Coll Cardioal 1996;27:132-9.


ibidem ou ibid.

– Para fazer referência, subseqüente, de um mesmo autor, em página diferente, de uma mesma obra. Ex.:

GONÇALVES, 2000, p. 61

Ibid., p. 203

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, v. 6, p. 15.

ibidem, p. 25.


idem ou id.

– Para fazer referência, subseqüente, de um mesmo autor. Ex.:

LAMPRECHT, 1962, p. 20

Id., 1964, p. 35

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões. 30. ed. São Paulo: Saraiva,  1995, v. 6, p. 15.

idem, p. 42


loco citato ou loc. cit.

no trecho citado – Remissão a um trecho citado anteriormente

PAPALEO, Celso Cezar. Aborto e contracepção: atualidade e complexidade da questão. Rio de Janeiro: Renovar, 1993, p. 278.

PAPALEO, Celso Cezar, op. cit., loc. cit.

SILVA; SOUZA; SANTOS, 1995, p. 99-115

SILVA; SOUZA; SANTOS, 1995, loc. cit.


opus citatum, opere citato ou op. cit.

obra citada

GONÇALVES, 2000, p. 50

LAMPRECHT, 1962, p. 20

GONÇALVES, op. cit., p. 216


passim

por aqui e ali, em diversas passagens – Indica referência a vários trechos da obra

GONÇALVES, 2000, passim

MOTA, Sílvia. Testemunhas de Jeová e as transfusões de sangue: tradução ético-jurídica. In: GUERRA, Arthur Magno Silva e (Coord.). Biodireito e bioética: uma introdução crítica. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2005, passim.


sequentia ou et seq.

seguinte ou que segue – Nos exemplos abaixo, da página indicada em diante.

PINTO, 1956, p. 31 et seq.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, v. 6, p. 15-17.

MONTEIRO, Washington de Barros, op. cit., p. 36 et seq.


É isso. Adicione em seus favoritos para quando precisar fazer uma monografia ou uma outra obra científica.

Referências

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Bibliometria e difusão de conhecimentos na Psicopedagogia: contexto recente, tendências e relevâncias

Bibliometrics and diffusion of knowledge in
Psysho-pedagogy: recente context, trends and relevance

Eliane Ferreira dos Santos (UNIFIEO/SP) efseliane@yahoo.com.br
Luiz Carlos Rodrigues (UNIFIEO/SP) lucarodrigues@hotmail.com
Michele Souza de Barros Gavasso (UNIFIEO/SP) msb.psico@gmail.com

 

Resumo

A Bibliometria se destaca hoje diante do advento dos meios eletrônicos e da constante evolução tecnológica à disposição da difusão de informações. A partir daí, muitos pesquisadores lançam mão dessa ferramenta para aprofundamentos em suas áreas e para construírem novos conhecimentos. Neste contexto, a Psicopedagogia não se apresenta como exceção, contribuindo com temas, métodos e problematizações disponíveis em artigos científicos e demais publicações acadêmicas, as quais realizam o compromisso da Bibliometria com a difusão do conhecimento. Nessa pesquisa, a partir de um recorte cronológico (1990 a 2011), buscou-se levantar as produções científicas da área de Psicopedagogia, categorizando-os a partir do ano de publicação, do meio de publicação, da área, do sexo do autor, bem como sua titulação e instutuição a qual está vinvulado.
Palavras-chave: Psicopedagogia, Bibliometria, Produção Científica.

Abstract

The Bibliometrics stands out today with the advent of electronic media and constant technological evolution available to the dissemination of information. Since then, many researchers avail use of this tool for insights in their areas and to build new knowledge. In this context, the Psychopedagogy isn´t an exception, contributing with subject matter, methods and concerns found in scientific articles and other scholarly publications, which realize the Bibliometrics's commitment to the dissemination of knowledge. In this research, based on an outline chronology (1990-2011), sought to raise the scientific production in the area of Educational Psychology, categorizing them from the year of publication, the publication medium, area, sex of the author, as well as their titles and institution which is bound.
Keyworld: Psycopedagogy; Bibliometrics, Scientific Production.

Introdução

O objetivo desta pesquisa foi identificar e analisar parte da produção científica sobre psicopedagogia, publicada em periódicos indexados na base de dados da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS-PSI) no període de 1990 a 2011.
A reflexão acerca da produção científica de determinado campo de conhecimento, agurmenta Bufrem (2007), implica necessariamente na elaboração de categorizações que permitem a visualização e interpretação de tendências de pesquisas, motivações, métodos de análise de dados e perspectivas da área questionada.
Os artigos de revistas acadêmicas são lidos com muito mais freqüência que qualquer outro tipo de publicação, sejam revistas comerciais, livros, relatórios técnicos, etc. (KING & TENOPIR, 1998).
O levantamento das atividades de pesquisa científica, sejam elas de qualquer campo do conhecimento, impõe a criação de seleções criteriosas, já que existe um dinamismo na relação do homem com seu contexto, o que, por sua vez, implica em um contínuo crescimento de métodos e olhares sobre a realidade.
Claro está que, apesar do homem se relacionar muito rápido com a realidade e, mais ainda, de vivenciarmos um momento no qual as comunicações são marcadas pela eficiencia e praticidade, a crítica acadêmica, essencial para o desenvolvimento da produção científica, não caminha na mesma velocidade, ou ainda, não atende de imediato a necessidade humana de controlar e manipular os saberes disponíveis, já que o universo documental disponível é muito extenso. (FERREIRA, 2010).
A presente pesquisa buscou, além de apresentar a pridução científica delimitada acima, aprodundar o debate acerca das preocupações e dos temas que se apresentam diante da Psicopedagogia.
Método
Trata- se de pesquisa de caráter documental, na qual levanta- se a produção científica da área de Psicologia nacional e internacional referente a Psicopedagogia.
- Material
As publicações analisadas foram em periódicos nacionais, especializados em Psicologia, a saber: Boletim- Academia Paulista de Psicologia, Caderno de Psicopedagogia, Ciências e Cognição, Construção Psicopedagógica, Estilos da Clinica, Estudos de Psicologia- Campinas/SP, Estudos em Psicologia- Natal/RN, Interdisciplinária, Paidéia, Psicologia Argumento – PUC/ PR, Psicologia, Ciência e Profissão, Psicologia Educacional, Psicologia em Estudo, Psicologia Educacional e Escolar, Psicologia Reflexão e Crítica, Psicopedagogia, Revista da Associação Brasileira de Orientação Profissional, Revista Cubana de Psicologia, Revista Departamento de Psicologia UFF, Revista Psicologia: Pesquisa & Trânsito, Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, Revista Psicologia- Teoria e Prática, Revista Temas em Psicológicos.
- Procedimentos
A pesquisa foi desenvolvida eletronicamente, na UNIFIEO- Centro Universitário FIEO Osasco/SP, no segundo semestre do ano de 2012.
Como recorte cronológico, o levantamento das publicações iniciou-se a partir de 1990, com publicações não digitalizadas. Sequententemente ao ano de 1993, as publicações encontravam-se defidamente disponíveis em meios eletrônicos.
Como primeira publicação disposta para consulta pública em meios eletrônicos, a qual atendia as delimitações dessa pesquisa, temos: “Uso da Fantasia como instrumento na psicoterapia infantil”, com autoria de Jaide A. R Nalim, analisado pela Sociedade Brasileira de Psicologia, e publicado na Revista Temas da Psicologia v.01 n.02 Ribeirão Preto/SP, disponibilizado para consulta pela Pepsic- Periódicos Eletrônicos em Psicologia.
O acesso aos Periódicos, foi realizado eletronicamente através do laboratório de informática da UNIFIEO- Centro Universitário FIEO- Osasco/SP- Campus Vl Yara, com base no BVS- PSI. Para tanto, o levantamento teve como palavra chave “Psicopedagogia”. A partir do material encontrado, uma analise prévia dos artigos permitiu selecionar o documentos que trata- se de Psicopedagogia.
As publicações foram organizadas a partir de análises de frequência, levando em conta o ano de publicação, a revista na qual foi publicada, a área de publicação do artigo, o sexo do autor, bem como sua titulação. Além disso, levou-se em conta, também, a categorização da instituição de vinculo profissional do autor entre, sendo essa dividada pelo carater público ou particular. Ainda com relação à instituição que acolhe o vínculo profissional do autor, foi criada a categorização “outros” para aquelas instiuições que, por sua vez, não se enquadraram no carater público ou particular. Em geral, correspondem a consultórios, clínicas ou quaisquer instituições ou entidades que não sejam especificamente de área ligada ao ensino ou à Educação.
A elaboração de gráficos e planilhas com as vertentes estipuladas, como critério de analise de resultados, permitiu uma leitura ampla, o que possibilitou as argumentações quantitativas dos dados.
Resultados
De 1990 a 2011, foram encontrados 144 artigos como referencial a palavra Psicopedagogia, estando 143 ( 99%) em periódicos da Psicologia e 1 ( 1%) em periódicos de Neurociência.
Na Tabela 1, que mostra a distribuição de acordo com os periódicos selecionados, pode- se constatar que a área de Psicologia costuma realizar mais publicações de artigos científicos, que as Revistas ligadas a Neurociência. Embora o fazer Psicopedagógico venha se constituindo num crescendo, ampliando seu âmbito de ação de modelos de investigação, muito ainda há a se fazer no que se refere ao campo da investigação científica, para que se possa verdadeiramente fazer frente a demanda que a originou, (BOSSA, 2000).
Existe muita demanda de preocupações e temas para a Psicopedagogia, porém ainda segundo Bossa (2000), somente pesquisas realizadas no contexto acadêmico poderão resultar numa produção de conhecimento capaz de transformar tal realidade.
image
Lançando o olhar para o que se refere ao ano de publicação e vinculo profissional do autor, constata- se que, na primeira década do século XI, publicou-se mais sobre a Psicopedagogia do que na última década do século XX.
Segundo Guimarães (CAPES 2011), entre 2005 e 2008, o ISI indexou e reindexou mais de 60 periódicos brasileiros. Só em 2008, o ISI incorporou mais de 1228 revistas de diferentes países. E ainda Guimarães (CAPES 2011), em 2009 este número aumentará, com a incorporação de mais 30 revistas brasileiras.
Na Tabela 2, que mostra a distribuição de artigos publicados por ano e tipo de vínculo profissional do autor, chega- se ao número de 6 ( 100 %) artigos publicados na última década do século XX, dos quais 2 (33%) autores dos artigos estavam vinculados profissionalmente a instituições públicas, 3 ( 67%) autores dos artigos vinculados profissionalmente a instituições particulares e finalmente 0 (0%) de autores estavam vinculados profissionalmente a outros tipos de instituições, tais como, consultórios particulares, clínica, instituições militares e financeiras.
image
image
Na Tabela 3, chega- se ao resultado da pesquisa em relação ao Sexo e Titulação de autores (as). Sendo que publicações de autores (as) do sexo feminino/graduados (as) chegam ao montante de 30 (30%), Mestrados (as) chegam a 35 (35%) e Doutorados (as) a 34 (34%). Gerando um total de 99 mulheres autoras de artigos publicados.
E o realizando o cálculo de autorias masculinas, vemos que, existem 10 ( 48%) Graduados, 6 (29%) Mestrados e 5 (24%) Doutorados. Calculada a frequência absoluta na somatórios dos dois sexos, chegamos aos números de, 40 (33%) Graduados , 41 (34%) Mestres e 39 (33%) de Doutores. Chegando assim ao total de 120 (100%) autores com titulações divididas entre Graduados, Mestres e Doutores. Se o olhara for dirigido á tabela apenas para verificar a Frequência Absoluta, independente de sexo do autor, verifica- se que, os autores titulados Mestres estão em escala um pouco maior na frente de produção científica.
image
Discussão
A partir dos resultados, evidencia-se a intensa presença da mulher como produtora de conhecimento na área de Psicopedagogia. Esse fato se justifica na História, já que é de longa data a participação da mulher na Educação no Brasil. Segundo Novais (1997), a princípio, ainda no Período Colonial, a participação da mulher na Educação se reservava ao lar, sendo ela responsável pela formação moral, religiosa e ética dos filhos dentro da cultura escravista predominante nesse período. Se considerarmos os limites da cultura brasileira, ainda incipiente, nos séculos XV, XVI e XVIII, concluiremos que a maior parte daqueles tantos outros que, de uma forma ou de outra, decidiriam os rumos político-econômicos e culturais do Brasil foram, no limite, educados e tiveram norteamentos éticos e morais transmitidos pelas mulheres.
Assim, não é de se espantar os números que mostram a presença mássica das mulheres nas produções acadêmica em áreas lidadas à Pedagogia, tornando raro, em muitas vezes, a presença masculina.
Com relação a coleta de dados e ao método baseado em categorizações, a Bibliometria se mostra como recurso altamente eficiente. Basicamente, a Bibliometria é uma área da ciência da informação que grosso modo "mede" a ciência; baseia-se no pressuposto da cumulatividade/dispersão da ciência, o que leva também a desdobramentos socioculturais, se pensarmos que a produção científica é sempre uma produção cultural e coletiva. (MOSTAFA & MÁXIMO, 2003).
As facilitações advindas das tecnologias disponíveis a favor da Bibliometria também são visiveis nas pesquisas, uma vez que podem proporcionar uma maior abrangência na exploração de todas as categorizações determinadas. Com vistas ao contexto tecnológico hoje à disposição dos pesquisadores, essencialmente depois do último quarto do século XX, a bibliometria se destaca como ferramenta indispensável no processo de construção do conhecimento e de sua difusão.
Diante da grande diversidade de possibilidades tecnológicas disponíveis, a Bibliometria encontrou na última década outras denominações, tais como infometria, informetria, cientometria e webometria, entre outros presentes na relação paradigmática que os abrange, representam práticas de mensuração da informação da ciência, ou de suas representações em modalidade convencional ou na Web, definindo com mais especificidade o universo quantificável a que se referem. (BUFREM, 2007).
Considerações Finais
O homem, faz de sua própria atividade vital o objeto de sua vontade e de sua consciência (MARX, 1998, p. 157). Dispondo dessa atividade vital consciente, ao produzir livremente, Brufrem (1996) entende que o homem se defronta com sua própria produção, a qual analisa e critica. Assim surgue a constante necssidade de informações demandada por pesquisadores que se justifica, em boa parte, a grande quantidade de análises de revistas científicas. Tal necessidade encontra nos meios eletrônicos a saciedade, já que dificilmente um artigo científico se tonará indisponível no universo virtual da “Ampla Rede Mundial” (World Wide Web / “www”).
Corroborando com o dinamismo proposto pelos artigos científicos através da praticidade trazida pelos meios eletrônicos, King & Tenopir (1998) afirmam que os cientistas se mantém atualizados, em grande parte, devido às leituras realizadas em revistas científicas.
Concordamos, portanto, que a Bibliometria proporciona em grande escala o cumprimento do objetivo mais essencial da produção científica, que é, no limite, a sua difusão. Indubitavelmente, não existe conhecimento único, desconecto de outros conhecimentos. Assim, Spinak (1996) apregoando Rousseau, considerou que devemos consolidar a idéia de que todas estas especialidades encontram sua ligação a partir da sua origem comum. Desta forma, concordamos, portanto, que a bibliometria cumpre esse princípio. Neste sentido, em favor das tecnologias e do dinamismo proposto pelo contexto em que se encontra hoje a Bibliometria, King & Tenopir (1998) afirmam que os cientistas se mantém atualizados, em grande parte, devido às leituras realizadas em revistas científicas disponíveis em meios eletrônicos.
Por fim, entendemos que a produção científica, decorrente das pesquisas desenvolvidas no meio acadêmico e, posteriormente devidamente publicadas e difundidas, oferece mais do que apenas indicadores de avaliação institucional. Os novos conhecimentos gerados nessas pesquisas têm repercussões não apenas na comunidade científica nacional, mas servem de medida para o avanço científico do país em relação à comunidade internacional.

 

Referência Bibliográfica

BOSSA, Nadia A. A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.
BUFREM, Leilah Santiago. Linhas e tendências metodológicas na produção acadêmica discente do mestrado em Ciências da Informação – Universidade Federal do Rio de Janeiro (1972-1995). 1996. Tese (Concurso para Professor Titular Métodos e Técnicas da Pesquisa) – Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 1996.
__________et al. Produção científica em ciência da informação: análise temática em artigos de revistas brasileiras. Perspectivas em ciências da informação. 2007, vol. 12, no. 1, pp. 38-49. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ci/v34n2/28551. Acesso em: 12 dez. 2012.
FERREIRA, Ana Gabriela Clipes. Bibliometria na avalização de periódicos científicos. Ciência da informação, v.11, n.3, junho. 2010. Disponível em: <http://www.dgz.org.br/jun10/Art_05.htm>. Acesso em 12 dez. 2012.
KING, Donald W.; TENOPIR, Carol. A publicação de revistas eletrônicas: economia da produção, distribuição e uso. Ciência da informação. Brasília, v. 2, n. 27, maio/ago. 1998. Disponível em: <http://revista.ibict.br/ciinf/index.php/ciinf/article/view/360/321>. Acesso em: 10 dez. 2012.
MARX, Karl. O trabalho alienado. In: OLIVEIRA, Paulo de Salles (Org.). Metodologia das ciências humanas. São Paulo: Hucitec: Unesp, 1998. p. 151- 163.
MOSTAFA Solange Puntel; MÁXIMO, Luis Fernando. A produção científica da Anped e da Intercom no GT da Educação e Comunicação. Ciência da Informação. Brasília, vol.32, no.1, jan/abr. 2003. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S0100-19652003000100010>. Acesso em: 12 dez. 2012.
NOVAIS, Fernando A. & SOUZA, Laura de Mello e (Org.). História da Vida Privada no Brasil: Cotidiano e Vida Privada na América Portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
SPINAK, E. Diccionario enciclopédico de bibliometría, cienciometría e informetría. Montevideo, 1996


























































terça-feira, 28 de agosto de 2012

A Síndrome de Caim

PSICOLOGIA E PSICOPEDAGOGIA: CONTRADIÇÕES E APROXIMAÇÕES[1]

A Síndrome de Caim, a exemplo da reflexão bíblica, opõe dois irmãos; o Psicólogo e o Psicopedagogo, respectivamente, Caim e Abel. Na passagem bíblica alusiva ao Livro de Genesis do Antigo Testamento de origem hebraica, uma das possíveis interpretações é a de que Caim matou Abel por inveja, ou seja, por entender que Abel ocupava um espaço desejado por Caim.

No entanto, entende-se que os irmãos por terem a mesma gênese deveriam socializar os sucessos e os fracassos naquele contexto, ou seja, no Paraíso recém-criado. Não se concebe que sentimentos tão diferentes do amor, da fraternidade ou da solidariedade pudessem nortear as relações entre duas pessoas tão próximas.

Assim podemos apresentar a relação conflituosa entre a Psicologia e a Psicopedagogia; irmãs em sua gênese e opostas em relação as suas atribuições.

Para os psicólogos, a psicopedagogia, tipificada academicamente como “especialização”, não pode ser considerada uma profissão e, portanto, não deveria atuar na solução e na compreensão dos problemas alusivos ao processo ensino-aprendizagem.

Porém, não é o psicólogo que está presente, pelo menos fisicamente na determinante maioria das instituições de ensino, mantendo uma relação direta com os alunos, os quais, no limite, seriam os mais beneficiados com sugestões, soluções ou discussões que pudessem (ou podem) melhorar o processo ensino-aprendizagem.

O psicopedagogo, por sua vez, está mais presente, por vezes alocado na própria escola, inserido no cotidiano dos alunos, coordenadores, gestores e professores possibilitando, assim, um acesso mais imediato em relação ao psicólogo.

Assim, neste primeiro momento dessa reflexão, a questão da Síndrome de Caim se apresenta como resultado de uma disputa por mercado, ou melhor, por uma reserva de mercado, já que o psicólogo e o psicopedagogo, ambos agora entendidos como categorias profissionais, colhem seus rendimentos a partir de consultas em comum. Desta forma, a economia dá conta de explicar a indisposição nessa relação conflituosa.

Porém, essa reflexão não pode permear apenas o universo da economia. É preciso lançar mão de algumas outras situações em que esses “irmãos” se distanciam. Assim, dentre essas situações, podemos apontar a vaidade, os esvaziamentos teóricos, tais como as generalizações e os oportunismos, e os objetos de pesquisas que tanto a Psicologia como a Psicopedagogia se propõe a estudar e pesquisar.

Para compreender e aprofundar essa reflexão, duas outras manifestações tem suas significâncias e relevâncias; a política e a infraestrutura educacional. Porém, antes de prosseguir, vale considerar e esclarecer que o entendimento aqui dado por infraestrutura educacional não está apenas na compreensão e visualização das instalações físicas e dos insumos que fomentam a realização de aulas em escolas, mas sim na compreensão de todo o conjunto de intenções, de interesses, de práticas e também de leis que norteiam as rotinas escolares.

O exercício da profissão do psicopedagogo pode não ser, em grande parte, reconhecida pelos psicólogos, porém é reconhecida no cotidiano da Educação e, também, pela sociedade em geral, a qual entende esse profissional como parte integrante de muitas escolas, orientando pais, professores, coordenador, gestores e alunos.

O direto ao exercício da profissão é garantido por Lei e, desta forma, reforça a condição de liberdade presente em nossa Constituição e, portanto, na vontade do povo. Mais especificamente, se pretende dizer aqui nessa reflexão, que o exercício da profissão, seja do psicólogo ou do psicopedagogo, não deveria ser entendido pelos profissionais como uma barreira, como uma em detrimento da outra, mas sim como parte dos interesses que tem por finalidades promover a qualidade no processo ensino-aprendizagem, orientar gestores para que possam fomentar suas rotinas administrativas e também pedagógicas, de modo a torná-las claras e objetivas para a comunidade escolar, e agir no sentido de minimizar os problemas que existem entre os alunos e o contexto em que se insere o processo ensino-aprendizagem.

Os entraves que dificultam a aprendizagem não se iniciam e nem se encerram na escola. Se o psicólogo ou o psicopedagogo estiverem nas escolas com a pretensão de isolá-las dos contextos sociais, econômico e, especialmente, político, oferecendo soluções imediatas para todas as perturbações que surgem no processo ensino-aprendizagem, então não estão ali de forma a exercerem uma profissão, mas sim exercerem apenas uma atividade sem frutos ou mesmo sem relação pedagógica. Em geral, se agirem assim, temos então a possibilidade de imaginar que os mesmos estão, portanto, a serviço de outros interesses e intenções que não são aqueles que suas respectivas ciências defendem e se debruçam ao longo do tempo. Exemplificando tal situação, não é raro escolas particulares usarem a figura do psicopedagogo ou do psicólogo como estratégia de concorrência, ou seja, para demonstrarem que ali a Educação é mais valorizada do que em outra escola que atue no mesmo espaço. Neste caso específico, o psicopedagogo e o psicólogo estariam abrindo mão de suas profissões e, em minha opinião, não realizariam nas escolas benefícios no sentido de fomentar a qualidade dos processos ensino-aprendizagem.

A Educação dentro da concepção proposta por J. J. Rousseau no século XVIII em relação à teoria do Contrato Social é um dever do Estado e está, pelo menos nas sociedades idealizadas e organizadas a partir do Iluminismo, a serviço da manutenção da ordem vigente. Ainda sim, é importante salientar que é sabido aqui nessa reflexão, que ao contrário do que vemos a Educação, teoricamente, deve servir para ideias mais nobres, tais como a transmissão de experiências de uma geração para outra, cujo objetivo é promover o conhecimento e o desenvolvimento humano em todas as suas possibilidades.

Na proposta do Contrato Social de Rousseau observamos que os indivíduos se dedicam a viver dentro das normas sociais, legais, éticas e culturais de um determinado espaço geográfico e, também, se dispõem a delegar poderes que, constituídos, determinam as regras a serem seguidas por todos. Essa relação, no limite, configura o sentido de Estado e de cidadania.

Tendo como base essa explanação, a Educação enquanto instituição organizada e regulamentada pelo Estado, tornando-se assim formal, ganha em dimensão e importância. Em dimensão porque pode estar nos lugares mais remotos de um território, já que é subsidiada pelos impostos. Assim, enquanto espaço físico, a escola se torna algo gigantesco. Em importância, por sua vez, a escola, por trazer em suas propostas o viés da presença do Estado e a maneira como esse último se relaciona com as questões sociais, acaba por servir como um instrumento de construção ideológica, atendendo esse ou aquele interesse na medida em que se dão os ditames político-econômicos.

Sabendo dessa relação intrínseca entre Estado, Educação e sociedade, os psicopedagogos e os psicólogos deveriam, antes de tudo, ver, compreender e praticar a Educação como o evento social capaz de transformar a vida humana e gerar qualidade de vida, seja para o presente ou para o futuro através do desenvolvimento da cidadania e do conhecimento.

Assim, de posse desse entendimento libertador, transformador e revolucionário, da Educação, os psicólogos e os psicopedagogos poderiam se entender como nexos constitutivos das soluções capazes de contribuir positivamente com os processos ensino-aprendizagem. Porém, são poucas as escolas e os profissionais que veem a Educação como evento social transformador. Em geral, reproduzem as visões que o Estado tem das questões sociais e, assim, apenas acumulam mazelas que jamais serão resolvidas apenas dentro das escolas. Sem uma preocupação mais relevante e sem uma visão ampla dos problemas relacionados à Educação, os conflitos entre psicólogos e psicopedagogos são meras intrigas familiares.


[1] Autoria da reflexão de Luiz Carlos Rodrigues, mestrando de Psicologia Educacional do Centro Universitário UNIFIEO, apresentado à disciplina de Fundamentos Históricos da Psicopedagogia, ministrada pela Drª Marcia Siqueira Andrade.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Desafios do Ensino Técnico no Brasil


Ederson Granetto entrevista Maria Laura Puglisi Barbosa Franco, professora do Centro Universitário FIEO sobre como seria um curso tecnológico "modelo" para o Ensino Médio, uma vez que o governo sinaliza com a intenção de aumentar os investimentos para esses cursos.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Achado escrito inédito de Karl Marx

O artigo “Mercado sem desenvolvimento: a causa da crise” é um dos achados do projeto MEGA – Marx-Engels GesamtAusgabe. A partir dos arquivos de Karl Marx, o MEGA está organizando a imensa obra ainda inédita do filósofo alemão: 114 volumes, o último dos quais será publicado em 2020. O texto em questão, jamais lido no Capital, parece ter sido escrito hoje. Deve-se sua revelação ao jornal "La Repubblica", que publicou o inédito artigo de Marx no domingo (08/01). A tradução é de Moisés Sbardelotto para o "IHU Online"

Mercado sem desenvolvimento: a causa da crise

Por Karl Marx

A enorme quantidade e variedade de mercadorias disponíveis no mercado não dependem apenas da quantidade e da variedade de produtos — mas são, em parte, determinadas pela entidade da parte de produtos produzidos como mercadorias, que deverão, portanto, ser inseridos no mercado para a venda na qualidade de mercadorias.

A grandeza dessa parte das mercadorias vai depender, por sua vez, do grau de desenvolvimento do modo de produção capitalista — que produz os seus próprios produtos apenas como mercadorias — e do grau em que tal modo de produção domina em todas as esferas da produção.

Deriva daí um grande desequilíbrio no intercâmbio entre países capitalistas desenvolvidos, como a Inglaterra, por exemplo, e países como a Índia ou a China. Esse desequilíbrio é uma das causas da crise.

Causa totalmente negligenciada pelos burros que se contentam em estudar a fase do intercâmbio de um produto por outro produto e que esquecem que o produto não é, portanto, em caso algum, mercadoria intercambiável enquanto tal. Isso constitui também a pedra no sapato que leva os ingleses, dentre outros, a querer subverter o modo de produção tradicional existente na China, na Índia, etc., para transformá-lo em uma produção de mercadorias e, em particular, em uma produção baseada na divisão internacional do trabalho (ou seja, na forma de produção capitalista).

Eles conseguem, em parte, esse intento, por exemplo, quando prejudicam os fiadores de lã ou de algodão vendendo seus produtos a um preço inferior ou arruinar o seu modo de produção tradicional, que não é capaz de competir com o modo de produção capitalista ou com o modo capitalista de inserir as mercadorias no mercado.

Embora o capital produtivo, por sua própria natureza, esteja disponível no mercado, isto é, oferecido à venda, o capitalista pode (por um período de tempo longo ou curto, de acordo com a natureza das mercadorias) mantê-lo longe do mercado se as condições não lhe forem favoráveis ou com o fim de especular, ou outro. O capitalista pode subtrair o capital produtivo do mercado das mercadorias, mas, em um momento posterior, será obrigado a reinseri-lo. Isso não tem efeitos sobre a definição do conceito, mas é importante para a observação da concorrência.

A esfera da circulação das mercadorias, o mercado, é, enquanto tal, diferente também fisicamente da esfera da produção, exatamente como são diferentes temporalmente o processo de circulação e o efetivo processo de produção. As mercadorias agora prontas ficam depositadas nos armazéns e nos depósitos dos capitalistas que as produziram (exceto no caso de serem vendidas diretamente), quase sempre só de modo passageiro, antes de serem expedidas para outros mercados.

Para as mercadorias, trata-se de uma estação de preparação a partir da qual serão inseridas na efetiva esfera de circulação, exatamente como os fatores da produção disponíveis permanecem à espera, em uma fase preparatória, antes de serem transportados para o efetivo processo de produção.

A distância física entre os mercados (considerados do ponto de vista da sua localização) e o lugar do processo de produção das mercadorias dentro de um mesmo país, e sucessivamente fora dele, constitui um elemento importante, porque é justamente a produção capitalista que faz com que, para uma boa parte dos seus produtos, o mercado seja constituído pelo mercado mundial. (As mercadorias também podem ser adquiridas para serem retiradas imediatamente do mercado, mas esse elemento deveria ser examinado em outros lugares, assim como a menção anterior às mercadorias que os produtores mantêm longe do mercado).

Consequentemente, é preciso que o mercado se expanda continuamente. Além disso, em todas as esferas individuais da produção, todo capitalista produz de acordo com o capital que lhe é oferecido, independentemente do que fizerem os outros capitalistas. No entanto, não será o seu produto, mas sim o produto total do capital investido nessa particular esfera de produção que irá constituir o capital produtivo, que oferece à venda esta e qualquer outra esfera individual de produção.

É um dado empírico que, embora a dilatação da produção capitalista leve a um incremento, a uma multiplicação do número de esferas de produção, ou seja, de esferas de investimento do capital, nos países de produção capitalista avançada, essa variação jamais mantêm o mesmo ritmo que o acúmulo do próprio capital.

Fonte:

Fundação Maurício Grabois:

http://grabois.org.br/portal/noticia.php?id_sessao=8&id_noticia=7827> Acesso em 13 jan. 2012.

Instituto Humanitas Unisinos:

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/505640-mercado-sem-desenvolvimento-a-causa-da-crise-artigo-inedito-de-karl-marx> Acesso em 13 jan. 2012.

Tiradentes. Peculiaridades da República: A mitificação de um herói que não passou de um bode expiatório

O principal objetivo do texto a seguir é o de procurar explanar a situação colonial brasileira na época em que ocorreu a inconfidência mineira. Mais que sua inserção no contexto histórico da época, procurará mostrar um pouco de seus precedentes desde a crise no sistema colonial até a formação da república brasileira e a construção do mito de Tiradentes.
Para isto, é preciso recordar o regime absolutista em meados do século XVIII (Boris Fausto, 1995). Foi quando surgiram os primeiros pensadores liberais como: Montesquieu, Voltaire, Diderot e Rousseau. Seus pensamentos embora diferentes, tinham no princípio da razão um ponto em comum. Seus ideais acabariam atingindo profundamente a toda população mundial, e suas divergências com o sistema vigente colocou em risco toda estrutura feudal, que veio a ruir com a revolução francesa em 1789 e a revolução industrial inglesa nesse mesmo período. É evidente que não foram somente as duas revoluções que acabaram com o antigo regime, existiu todo um processo de desgaste em volta do sistema e que neste contexto não convém ser abordado.
Sendo mais específico, tratarei sobre a questão da metrópole, Portugal. Boris fausto (1995) analisa o país como uma nação atrasada e totalmente dependente da Inglaterra contra seus inimigos Espanha e França. Em 1750, D. José I é elevado ao reinado de Portugal, porém o personagem mais importante foi seu ministro: O marquês de Pombal. Este pegou o país em cacos, com uma economia falida e dependente do dinheiro externo, com uma capital totalmente destruída em 1755 por um terremoto, com um terço das terras do país em nome da igreja (Dom Luís da Cunha, 1976), uma população diminuta, dentre outras situações graves. Tentou reavivar o comércio, com a criação das companhias de comércio no norte e nordeste do Brasil, incentivou a instalação de manufaturas. Confiscou os bens e expulsou os jesuítas do país. Estas sangrias e possíveis soluções já teriam sido anunciadas por D. Luís da Cunha (1976) no reinado anterior a D. José I (o de D. João V), que talvez tivesse oferecido seu aparato ideológico a Pombal, que as pôs em prática assim que se tornou ministro. Com o fim do reinado de D. José, também chegou ao fim a era Pombal, e quem assume o trono é D. Maria I. Os feitos de Pombal foram anulados, a rainha ficou conhecida como “viradeira” (1995, p.112) justamente por ter anulado quase todas as ações políticas de Pombal, como por exemplo a proibição à instalação de manufaturas na colônia.
E é justamente no período de reinado de Dona Maria I que se situa o marco principal do texto: analisar a inconfidência mineira; uma revolução que nem chegou a acontecer, não derramou sangue algum e mesmo assim virou o maior símbolo de resistência contra a metrópole. A começar pelo nome “inconfidência”. Muita gente principalmente depois da instauração da república até os dias atuais se enche de orgulho ao falar da inconfidência e dos inconfidentes. Este termo foi usado pela coroa para qualificar aqueles que tramaram contra ela, que a traíram com o objetivo da independência (das capitanias de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro); portanto um termo pejorativo. Aliás o projeto de independência englobava a princípio apenas as três principais capitanias da colônia (movimento portanto regional e não nacional), apesar de no futuro, depois do estabelecimento da independência se estender a todo país. O comandante nos primeiros três anos seria o magistrado e poeta Tomás Antônio Gonzaga e a capital São João Del Rei, próxima à cidade sede da conjura, Vila Rica.
O descontentamento com a coroa era crescente, dentre os inconfidentes muitos foram prejudicados principalmente pelo quinto do ouro (imposto cobrado para quem não atingisse a meta de coleta do ouro estabelecida pela metrópole) e a política de exploração da metrópole, pois destes a maior parte fazia parte da elite colonial. Uma exceção era Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, que fazia carreira militar no posto de alferes e “nas horas vagas exercia o ofício de dentista” (1995, p.115). Segundo Boris Fausto Portugal pressionava cada vez mais, seu representante em terras mineiras, Visconde de Barbacena instaurou a derrama (mais um imposto que abrangia todos os habitantes da colônia) e ainda recebeu a incumbência de investigar todos que deviam para a coroa (Os maiores devedores faziam parte da elite). Tiradentes se viu contrariado quando perdeu seu posto de comandante do destacamento dos dragões.
Até então ninguém atrevia a se rebelar contra a coroa, e a elite descontente buscou inspiração em outras revoluções ocorridas pelo mundo afora, principalmente a independência dos Estados Unidos em 1776 e a revolução francesa de 1789, através da experiência vivida por seus membros em países europeus. Em finais de 1788, os inconfidentes começaram a se preparar para o movimento até que um dos seus, Joaquim Silvério dos Reis denunciou seus até então companheiros. Cada membro teve sua prisão decretada e sua sentença anunciada: a pena de morte. A população, horrorizada acompanhava todo processo; estava indignada e ao mesmo tempo com medo da repressão e do que iria acontecer com os onze condenados.
Sentindo que tinha cumprido seu dever – o de intimidar toda a população - a coroa decide abrandar as penas: os conjurados seriam exilados e apenas a pena de Tiradentes foi mantida. Em 21 de abril de 1792 se deu sua execução. O espetáculo da forca, que muitos apenas ouviram falar estava diante de seus olhos. Todos assistiram seu enforcamento, seguido do esquartejamento e a exposição de sua cabeça na praça principal de Vila Rica. Aí se iniciava a construção do maior mito da república brasileira.
Depois da execução de Tiradentes, Silvério dos Reis (que assim como boa parte dos inconfidentes também devera à coroa e o perdão de suas dívidas se deu com sua inconfidência aos inconfidentes como relata José Murilo de Carvalho em sua obra, A formação das almas : O imaginário da república do Brasil (1990) no capítulo que se refere à inconfidência), ficou marcado pela traição, indo morar em vários lugares e sendo hostilizado em todos por onde passou; até mesmo no Maranhão era insultado.
Logo de cara, é evidente que não se poderia fazer nada a fim de engrandecer a figura de Tiradentes até porque os dois imperadores do Brasil eram descendentes da rainha que o condenou. Nesta época ele era apenas um futuro mártir.
No advento da república, passou a se procurar uma figura que valorizasse tal ato, uma figura que significasse bravura, carisma que fosse popular. A temporada de caça ao herói foi aberta. Cogitou – se Deodoro da Fonseca, porém este ainda mantinha suspeitas quanto sua relação com a monarquia, além de ser uma figura militar e não muito popular. Os positivistas indicaram Benjamin Constant, “mas o problema era que ele não tinha cara de herói” (1990, p.56). Outro candidato era Floriano Peixoto, por uns aclamados pela atuação na revolta armada do Rio de Janeiro e na revolta federalista, por outros chamado de déspota. Não servia. Por eliminação chegou-se ao nome de Tiradentes. Digo por eliminação, pelo fato de ninguém do movimento do 15 de novembro ter todos esses atributos, sendo então escolhida uma pessoa que até então se tinha muito pouco documentado.
Após a morte de Tiradentes, a inconfidência era um tema evitado pela coroa, pois a independência do país fora declarada pelo neto de D. Maria I. Na literatura, começam a aparecer as primeiras referências ao herói com As liras de Gonzaga em 1848 (56 anos depois); Castro Alves em sua peça Gonzaga ou a revolução de Minas seria um dos primeiros autores a associar a figura do Mártir à de Jesus Cristo.
Dada a iniciativa, a criatividade foi além; Luís Gama, um abolicionista e republicano (1990), comparou a forca à cruz de Cristo, Rio de Janeiro à Jerusalém, o calvário ao Rocio (Local da forca) (1990) e cada vez mais a figura de Tiradentes, até então sem um rosto ganhou as feições de Cristo. Ultrapassando a aparência física, os atos também foram lembrados, como a falta de resistência à condenação, o beijo nos pés do carrasco simbolizando o perdão, e a morte pelo ideal da independência.
Durante o reinado de D. Maria I e posteriormente do regente D. João, outras revoltas foram surgindo e com elas outros mártires como Frei Caneca na Revolução de 1817 em Pernambuco, ou Bento Gonçalves na Revolução Farroupilha. O gaúcho perde pelo regionalismo de seu levante; já o pernambucano Frei Caneca por sua região se localizar em local afastado do grande eixo da colônia. Outra explicação seria a resistência oferecida à coroa e sua rebeldia; lembrando que Tiradentes morreu como vítima e não como rebelde.
Um outro atributo além de todos já apresentados, seria a identificação de Tiradentes com as três principais aspirações dos brasileiros enquanto colônia: A independência, o abolicionismo e a república.
José Murilo de Carvalho finaliza seu texto dizendo que Tiradentes só sobrevive até hoje, por “sua resistência aos continuados esforços de esquartejamento de sua memória” (1990, p.73)
Já este texto, termino explicando o seu título. A peculiaridade se dá a partir do momento da construção de um herói que não lutou e não resistiu, sua revolução sequer aconteceu. O que aconteceu foi a tentativa de apagar da memória dos brasileiros a época em que o Brasil era subordinado português, expondo apenas uma das inúmeras atrocidades lusas em territórios brasileiros, tentando assim firmar o regime que acabara de nascer: o republicanismo. Por sinal deu certo. Já a dúvida sobre a mitificação do herói não existe. Ele está lá e todos sabemos disso. O que não sabemos, ou pelo menos eu, é se foi mesmo Tiradentes o principal líder desse movimento, se ele realmente pegou a culpa para si enfrentando todas as conseqüências depois, ou se ele apenas entrou de gaiato na história e foi morto apenas para se mostrar que, quem mandava nesta terra era a rainha insana e quem ousasse duvidar acabaria como o mártir.
Outra certeza, é de que todo esse teatro lusitano teve efeito contrário: ao invés de meter medo causou comoção nas pessoas, não só nas mineiras, cariocas ou paulistas e sim nas de outras capitanias, demonstrando um dos primeiros sinais de nacionalismo; não que inconfidência mineira em sua essência tenha sido um movimento nacionalista, mas o que ela desencadeou foi um sentimento, um sentimento do que hoje podemos chamar de identidade brasileira.

Referências Bibliográficas:
CUNHA, D. Luís. Testamento político – Biblioteca de ciências sociais, série 2ª, vol.1, direção de Reynaldo X.C. Pessoa, Maria de Lourdes Janotti e José S. Witter - São Paulo; Alfa – Omega, 1976.
FAUSTO, Boris. História do Brasil – 2ª ed. São Paulo: Fundação do desenvolvimento da educação, 1995.
CARVALHO, José Murilo de. “Tiradentes: um herói para a república” In: A formação das almas: o imaginário da república do Brasil – São Paulo: Companhia das Letras, 1990.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Fotografia e História da Educação






Professora Mirtes C. Marins de Oliveira
Mestre e Doutora em Educação PUC-SP
Coord. do Bacharelado em Artes Plásticas da FASM



http://www.hottopos.com/vdletras6/mirtes.htm

terça-feira, 24 de julho de 2012

Foucault e a Educação

Qual a relação de Foucault com a educação? Uma relação óbvia é posta pelo tema do poder. Foucault estudou e descreveu práticas disciplinares. A escola é um lugar chave para “disciplinas”. Assim, estudar o poder na escola, o que se faz nas práticas pelas quais o poder que se faz sentir no âmbito escolar, é algo tem tudo a ver com Foucault.  A questão é saber por qual razão se faz isso?

A melhor razão ainda é a do próprio Foucault. E isso é visível quando perguntamos a Foucault no que ele esteve interessado.

A resposta de Foucault sobre seus interesses foi só uma: o sujeito. A modernidade se preocupou com o sujeito como instância na qual o conhecimento se dá. Caso tenhamos que estudar o conhecimento, então, para os modernos o melhor seria estudar, antes, aquele que conhece – o sujeito. Os filósofos modernos, todos eles, elaboraram o seu desenho de sujeito – o seu mapa do eu. Assim, se há falhas no conhecimento, elas devem ser procuradas antes na instância que conhece que propriamente na narrativa que mostra o conhecido. Foucault entendeu muito bem esse objetivo dos modernos. Mas ele reconsiderou o problema da seguinte maneira: talvez eu não tenha que me preocupar com o sujeito como o local do conhecimento e o elemento que criva o que é o verdadeiro e o falso ou, ao menos, dá o crivo para julgar o verdadeiro e o falso, mas tenha mesmo de saber como é que criamos a figura do sujeito.

Foucault buscou contar a história da subjetividade. Para tal, procurou ver a constituição do indivíduo e, então, a partir daí, contar como a filosofia, por abstração, montou seu conceito de sujeito moderno. A hipótese de Foucault foi a seguinte: os mecanismos de poder, ou seja, as práticas disciplinares, ao longo de toda uma história da cultura e da civilização, buscaram fazer o que Nietzsche chamou de processo de tornar o homem um animal capaz de prometer e cumprir o prometido. Sendo assim, são as práticas disciplinares que forjam aquele que é “consciente de seus pensamentos e responsável pelos seus atos”, o sujeito, aquele que promete e cumpre. O homem assim promete porque a vida social implica em promessas. Cumpre por receios, medos, condicionamentos e, principalmente, culpa e angústia diante do possível arrependimento. Tudo isso, que é tipicamente o que preenche uma subjetividade, é o que se fez por meio de práticas disciplinares. Na escola, então, isso é mais que visível, uma vez que toda a educação moderna é, explicitamente, uma educação voltada para a criação do sujeito no indivíduo.

As práticas disciplinares passaram de violentas para sutis e, então, foram mais eficazes. Isso Foucault mostrou na sua visão história da modernidade. Essas práticas mostraram o que Foucault chamou de positividade do poder. O poder molda, é claro, mas não reprime no sentido do não deixar fazer; o poder se exerce no sentido de tornar o agente mais ativo do que é, fazendo o que é necessário para sua produtividade social enquanto sujeito que se constitui. A construção da identidade, dos sentimentos, das formas de consciência e dos modos de responsabilidades, ou seja, tudo que constitui um sujeito, é algo que, na escola, encontra um ambiente propício para acontecer.

Chegamos, então, na razão pela qual se pode estudar a escola, na ótica de Foucault, e ao mesmo tempo não sair dos objetivos pelos quais se estuda o poder, inclusive na escola. Foucault está preocupado com os processos de subjetivação. O exercício do poder, inclusive e sobretudo na escola, mostra esse panorama.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Filosofia da Educação

 

Para que Filosofia da Educação?

Talvez seja mais pertinente perguntar: para que filosofia na educação? A resposta é simples: porque educação é, afinal de contas, o próprio “tornar-se homem” de cada homem num mundo em crise.

Não há como educar fora do mundo. Nenhum educador, nenhuma instituição educacional pode colocar-se à margem do mundo, encarapitando-se numa torre de marfim. A educação, de qualquer modo que a entendamos, sofrerá necessariamente o impacto dos problemas da realidade em que acontece, sob pena de não ser educação. Em função dos problemas existentes na realidade é que surgem os problemas educacionais, tanto mais complexos quanto mais incidem na educação todas as variáveis que determinam uma situação. Deste modo, a “Filosofia na educação” transforma-se em “Filosofia da Educação” enquanto reflexão rigorosa, radical e global ou de conjunto sobre os problemas educacionais. De fato, os problemas educacionais envolvem sempre os problemas da própria realidade. A Filosofia da Educação apenas não os considera em si mesmos, mas enquanto imbricados no contexto educativo.

Penso que disto decorrem duas conseqüências muito simples, óbvias até! A primeira é que todo educador deve filosofar. Melhor ainda, filosofa sempre, queira ou não, tenha ou não consciência do fato. Só que nem sempre filosofa bem. A este respeito afirma Kneller (1972. p. 146):“se um professor ou líder educacional não tiver uma filosofia da educação, dificilmente chegará a algum lugar. Um educador superficial pode ser bom ou mau. Se for bom, é menos bom do que poderia ser e, se for mau, será pior do que precisava ser”.

Que problemas no campo da educação exigem de nós uma reflexão filosófica, nos termos acima explicitados? São muitos. Permitam-me apontar apenas alguns.

Já que a educação é o processo de tornar-se homem de cada homem, é necessário refletir sobre o homem para que se possa saber o “para onde” se deve orientar a educação. É necessário, porém, que esta reflexão não seja unicamente teórica, abstrata, desencarnada. É preciso levar em conta a situação espácio-temporal em que ocorre o processo. Com efeito, não importa apenas o “tornar-se homem”, mas o “tornar-se homem hoje no Brasil”. Só desta forma podemos estabelecer com clareza o que, por exemplo, se tem convencionalmente chamado de “marco referencial”, a partir do qual, numa instituição educativa, currículo, planejamento e atividades podem atingir um mínimo de coerência e de eficiência.

Que teoria de aprendizagem adotar? Que métodos e técnicas utilizar? Já afirmavam Binet e Simon correr “o risco de um cego empirismo quem se conforma em aplicar um método pedagógico sem investigar a doutrina que lhe serve de alma”. Não há métodos neutros. Não há técnicas neutras. No bojo de qualquer teoria, de qualquer método, de qualquer técnica está implícita uma visão de homem e de mundo, uma filosofia.

A filosofia é, assim, norteadora de todo o processo educativo. O maior problema educacional brasileiro sempre foi e ainda é, a meu ver, o denunciado por Anísio Teixeira no título de uma de suas obras principais: “Valores proclamados e valores reais na educação brasileira”. Quer em nível de sistema, quer em nível de escola, proclamamos belíssimos princípios filosófico-educacionais. Na prática, entretanto, caminhamos ao sabor das ideologias e das novidades e – o que é pior – sem nos darmos conta da incoerência existente entre nossas palavras e nossos atos.

A segunda conseqüência a ser tirada do que antes dissemos é quetambém o educando deve filosofar, ou seja, deve refletir sistematicamente, buscando as raízes dos problemas - seus e de seu tempo - de modo a formar uma “visão de mundo” e adquirir criticamente princípios e valores que lhe orientem a vida. Só assim serão homens e não robôs. É preciso, pois, municiá-lo de instrumentos racionais e afetivos para que se habitue a ser crítico, a não se contentar com qualquer resposta, a colocar sempre e em tudo uma pitada razoável de dúvida, a cavar fundo e não se intimidar perante a tarefa ingrata de estar sempre questionando e se questionando.

A partir de minha já longa experiência de magistério, posso afirmar que há sempre fome de filosofia. Basta levantar um problema nos termos acima descritos para que se alcem as antenas, sobretudo as juvenis! Talvez porque, tendo uma percepção não muito nítida, mas agudamente sentida da crise, faltem aos jovens o instrumental necessário para explicitá-la, analisá-la e julgá-la, em razão do banimento a que assistimos da filosofia, até mesmo de nossos currículos escolares.

Conclusão

Não há, portanto, como fugir à filosofia no campo da educação. Ela se relaciona intimamente com a função nem sempre levada a sério e, não obstante, fundamental, de avaliar. De fato, a avaliação resume, de certo modo, ou acompanha, como um vetor ou como um eixo orientador, todo o processo educacional. Ela se faz presente no início do processo, ao estabelecermos as metas; no seu decurso, quando traçamos e executamos as estratégias; no final, quando julgamos o que e quanto foi cumprido. Ora, avaliar é emitir juízos de valor e estes implicam sempre, queiramos ou não, consciente ou inconscientemente uma posição filosófica, uma filosofia.

Uma palavra, talvez, resuma tudo o que tentamos dizer: a filosofia é o aval da educação!

Referências bibliográficas

BOCHENSKI, J. M. Diretrizes do pensamento filosófico. São Paulo: EPU, 1973. 119 p.

JASPERS, Karl. Iniciação filosófica. Lisboa: Guimarães, 1977. 173 p.

SAVIANI, Dermeval. Educação; do senso comum à consciência filosófica. São Paulo: Cortez, 1980. 224 p.

KNELLER, Georges. Introdução à filosofia da educação. 4.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1972. 167 p.

Extraído de Estudos Leopoldenses, São Leopoldo, v. 21, n. 85, p. 29-36. Revisado e modificado pelo autor do blog em 23/07/2012.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Educação, Estado e a personificação do caos

por Eliane Ferreira dos Santos

A Educação, como posta hoje, especialmente em maior grau no ensino público, assume em boa parte uma estrutura que não contribui com a crítica aos modelos econômicos vigentes ou mesmo com a construção da cidadania, o que, no limite, é o objetivo primeiro da Educação/Escola dentro de um universo democrático.

A falta de capacidade das escolas em competir com a mídia de massa quando se trata de conscientizar o indivíduo, faz com que tenhamos comportamentos muito mais próximos da ideia de construção de um indivíduo adequado ao consumismo do que da ideia de sujeitos transformadores da realidade.

Diante dessa falha, ou desse distanciamento de propostos e objetivos, os fracassos escolares recaem, em muitas vezes, na figura do professor, determinando uma perspectiva individualizada do problema.

No Brasil, desde o Descobrimento, a prática de personificar a culpa de fracassos políticos, econômicos e sociais se faz presente em todo momento. A Coroa portuguesa tendia a culpar os índios pela promiscuidade que se encontrava a Colônia, mais tarde, a mesma Coroa portuguesa insistiu por séculos na ideia de que o escravo africano era o responsável pelas quedas de produtividade nas lavouras, primeiro de cana e mais tarde de café. Já no século XIX, a Monarquia brasileira, filha da Cora portuguesa, sustentou de forma maquiavélica a necessidade de promover a imigração europeia no fato de que o negro cativo não era “hábil” na lida agroexportadora. Mais adiante, já no período Republicano, os operários eram os culpados pela má organização da industrial nacional, pois estavam, segundo o Estado, “mais preocupados com os sindicatos do que com as máquinas”. Nos períodos mais próximos do nosso cotidiano, vimos recaírem culpas sobre a esquerda e, agora, parece que o alvo escolhido para atribuir a falência da Educação no Brasil é o professor.

Essa tendência de personificar culpa vem de cima para baixo, ou seja, vem do governo para os governados e, esses últimos, tendem a aceitá-la sem questionamentos e sem análises mais coerentes. O Estado brasileiro sempre foi tão convicto de que as pessoas são culpadas por tudo, que projetou o Exército para ter o povo como inimigo. Tirando a Guerra da Tríplice Fronteira, na segunda metade do século XIX e a Segunda Guerra Mundial em meados do século XX, o Exército sempre atuou contra o povo, contendo-o, torturando-o, censurando-o, vigiando-o. Ainda sim, nos dois momentos citados, o Exército não esteve a serviço da população nas empreitadas militares, mas sim na defesa de interesses político-econômicos de outras nações; nos casos citados, a Inglaterra e os EUA respectivamente.

Conclui-se, portanto, que o inimigo do Exército Brasileiro é o povo e, entendo que o Exército é parte do Governo, logo é o Governo que vê o povo como ameaça aos seus interesses, práticas e poderes.